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[MCP3] A dor de fim de ano

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Acredito não ser novidade para ninguém, que me conheça, que sou um pouco guloso.

Com o passar dos anos essa gulodice tem amainado e a singularidade que eu tinha no lugar do estômago está se fechando.

Mas em minha tenra juventude eu era uma pequena draga. Talvez como a maioria das crianças em fase de crescimento, eu brincava muito. E isso inclui correr e pular mundo afora. Parando para pensar, talvez por eu estar tão ocupado brincando ou estudando, quando me dava conta da hora das refeições, eu estava morrendo de fome. Se a comida fosse muito gostosa ou especial, algo como strogonoff ou pizza, eu me acabava.

Inclusive isso me recorda um fato curioso da minha infância. Geralmente dia primeiro de janeiro eu passava de cama por ter exagerado na comilança da ceia de ano novo. Como dizer para um menino guloso de seis ou sete anos para se controlar com salgadinhos, rabanadas, frango, pernil e um monte de outras guloseimas deliciosas servidas à vontade? Eu passei por isso cerca de três anos, mas lembro de sempre pensar que apesar da dor, tinha valido a pena. Não preciso nem dizer que minha mãe não ficava nada feliz com minha atitude e só não me dava uma surra porque eu já estava sofrendo demais. Quem sabe ela tinha um pouquinho de satisfação quando me dava chá de boldo? Que troço ruim!

Outro caso de gulodice juvenil aconteceu na minha adolescência. Os rodízios tiveram um grande bum no fim dos anos 1990 e eu vi de perto algumas pizzarias inovando nessa nova seara gastronômica que surgia no Rio de Janeiro. Uma pizzaria tinha meu apreço e ficava em Vila Isabel, chamava-se Buzzin e tinha um maravilhoso rodízio de massas. Sim, massas. Imagine a cara de felicidade de um guloso que além de saborear pizzas ainda comeria lasanha, canelone, calzone, espaguete e outros prato deliciosos. Tudo isso por um módico preço o qual não me recordo no momento. E como eu não estava esbanjando dinheiro nessa época, teve uma vez que eu e um amigo fomos, mas não tínhamos dinheiro para pagar as bebidas e no auge da sede, pedíamos pizzas de chocolate e só comíamos o chocolate para dar uma aliviada. Mas o amor acabou quando numa das pizzas doces, o garçom que andava com uma pistolinha de metal ofereceu uma coisa que até hoje me lembro do estalo que deu nos ouvidos glutões: “Aceita chantilly?”. Meus olhos brilharam com tamanha intensidade que faltei babar de exultação. Pedi gentilmente que o moço cobrisse minha pizza com quase cinco camadas do extrato de nuvens angelicais. Pobre jovem, do céu ao inferno em três fatias. Passei o resto do rodízio conhecendo cada azulejo do banheiro do restaurante enquanto meus amigos se acabavam de comer e rir, e eu sentado no vaso desolado com a porta na fresta conversando com eles. Não foi nada legal.

Dizem que aquilo que não mata engorda. Começo a suspeitar ser um grande sobrevivente.

Até amanhã.