Meia oito sete nove
Silêncio sepulcral.
Até seria normal se Antônio morasse em um necrotério, porém morava com a família que era composta por 6 membros. Todos moravam naquela casa centenária, herança dos tempos dos barões do café. Era comum na mesma época todos na sala, bebericando o negro líquido fumegante, enquanto contavam como estavam as coisas na cidade, como foi o dia, essas coisas que os parentes faziam antes mesmo da invenção e popularização do telefone. O mais tecnológico que poderia era o novíssimo rádio, que ficava na sala e todos poderiam ouvir aquelas pessoas famosas cantando e apresentando seus programas.
Antônio por muitas vezes se perdia nesse mundo, onde ele só podia imaginar e recordar dessa época que não viveu através de fotos antigas que pesquisava na internet. Já era rotina sua mãe chamar a família para jantar pelo twitter. Jantar era só o nome da refeição que cada um fazia no tempo e cômodo da casa que lhes conviessem. Já teve casos de a primeira pessoa almoçar à uma da tarde e a última por volta de seis da noite, quase na hora do jantar. Ele ficou sabendo semana passada que seu irmão estava noivo, quando viu o vídeo do pedido no facebook. ele não via o irmão pessoalmente há quase um mês.
Porém, quando um dia um raio explodiu um transformador na rua, sua casa ficou três dias sem energia. Apesar de toda a complicação na vizinhança, conseguiram alugar um transformador, apenas para deixar todas as geladeiras do bairro funcionando.
Antônio acabou conversando mais com seus familiares e acabou conhecendo melhor sua família em três dias do que em vinte e um anos de existência. Inclusive tal qual foi sua surpresa no dia em que a luz voltou, saber que seu avô trabalhara uns anos na companhia elétrica da região, após flagrá-lo guardando as ferramentas na garagem com as quais conseguira destruir o transformador naquele dia que choveu muito.
Que texto lindo. Reflete bem os moradores do 701.
Só quando cai a luz que rola algum tipo de interação sem mediação tecnológica.