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Algumas palavras sobre o ensino #01

Quem me acompanha no twitter já sabe, mas caso você não acompanhe eu falo aqui: eu sou professor de Geografia. Já devo ter comentado isso no blog, mas não me dei ao trabalho de procurar. E se eu procurar, desisto de escrever este post.

E, cara, já vi muita besteira nesse pouco tempo que tenho de carreira. Vi alunos muito inteligentes, vi alunos com sérios problemas de aprendizagem e vi muitos que são iguais ao que eu era: a turma do meio. A turma do meio, para quem não sabe, é aquela que consegue ser 50% inteligentes e 50% bagunceiros.

Também vi o quanto o governo conseguiu estragar o ensino. Antes os professores tinham a liberdade com relação ao conteúdo a ser ensinado. Há diretrizes do que deve ser ensinado a cada série. Não tem como ensinar logaritmos a uma classe de 5º série, claro. Mas os professores podiam decidir a sequência a ser ensinada. Hoje é diferente.

Uma das diferenças é que o governo de SP envia uma apostila que o professor deve usar. Obrigatoriamente. E aí dele se atrasar. Só que ele não envia todas as apostilas que serão usadas. O volume 1 vem no primeiro bimestre, o 2 volume no segundo bimestre e assim vai. Isso quando vem, claro. Aí você tem que seguir o roteiro que o governo definiu.

Um exemplo: a um determinado ponto da apostila ele pede para trabalhar com os alunos a noção de escala. Só que primeiro ele dá uns exercicios chatos, só depois ele vem trabalhar o básico. É como se primeiro você aprendesse a recitar Shakespeare para depois aprender o ABC.

Claro que algumas vezes o governo acerta. Um deles é distribuir livros, de acordo com a faixa etária. Eu achei isso muito bom, e até ajuda os professores a trabalharem com esses livros. E tem muitos livros bons: Arthur Conan Doyle, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto e outros que não lembro, no momento.

E no meio desses livros há O Cem Melhores Contos Brasileiros do Século.

Essa coletânea, feita pelo professor Ítalo Moriconi, é realmente uma ótima coletânea. Não excelente, porque toda coletânea é injusta. E esse livro foi distribuído para os alunos do último ano do ensino médio. Qual o porém? No meio da coletânea há o conto “Obscenidades para uma dona de casa”, do Ignácio de Loyola Brandão.

A ideia do conto é chocar. O problema é o linguajar. Um trecho: A tua boca engolindo inteiro o meu cacete e o meu creme descendo pela tua garganta, para te lubrificar inteira. Dentro do contexto esse trecho faz sentido, afinal, conta sobre uma dona de casa carola que recebe umas cartas com trechos assim e tem toda a crise dela, se é certo essas coisas ou não.

Se um professor ou professora for trabalhar esse texto em sala, vai ter que ser muito bom, pois uma sala de aula possui pessoas de vários tipos, credos e dívidas. Seria um desafio gigante trabalhar esse texto e fazer os alunos não descambarem para as piadas e, assim, perder o controle da aula.

Mas a minha grande curiosidade é ver como um professor de português, que tive no ensino médio, iria trabalhar com esse texto. Aposto que ele iria começar a suar de nervoso.